Na Revista Humanos, falamos muito sobre coletividade. A primeira edição foi com o Ailton Krenak e ele falou muito sobre o poder de coletivos. Tem uma citação que você faz no seu livro em que você está falando do Saramago, e você fala “não acredito em soluções fáceis nem em receitas para um mundo melhor, que não incluam nossos deveres para com os outros”.
O você pensa que a COVID-19 trouxe para a gente de aprendizado de coletivo?
Eu não quero perder a esperança. Como eu te falei, a esperança é teimosa, cansada, mas eu não quero perdê-la, conscientemente se assim posso dizer. Eu te disse que eu ainda tenho alguma esperança de que essa tragédia toda possa gerar um fenômeno coletivo que seja bom, senão para todos, para muitos. E o primeiro deles é um certo cuidado maior com o outro. Se você me perguntar, realisticamente, se eu estou vendo isso, eu te diria que não, mas nós tivemos algumas questões que a meu juízo são muito paradigmáticas. Por exemplo, eu me lembro que na primeira entrevista que eu dei, no dia 14 de março de 2020, eu disse na TV Globo que se a iniciativa privada brasileira não comparecesse, a nossa exclusão social, que é obscena – e ao dizer isso, eu não estou sendo retórica, eu estou sendo realista – a tragédia seria muito maior. A iniciativa privada brasileira, a nossa cultura e sociedade são extremamente excludentes, egoístas, não delicada no trato com o outro. Eu acho que uma iniciativa, por exemplo, como “Todos Pela Saúde” do Banco Itaú, que hoje virou “Instituto Todos Pela Saúde”, que fez uma contribuição enorme, financiou muitos projetos pelo Brasil. Aqui no Rio, a “União Rio”, que também financiou muitos projetos, nos ajudou nos projetos da Fiocruz em áreas de grande concentração e muita pobreza, como Manguinhos, o Complexo de Manguinhos, Complexo da Maré. Nós fizemos trabalhos extraordinários nessas áreas durante a pandemia.
Eu acho que há essa coisa para entender no Brasil, um esforço de observação, – um país dessa concentração de renda que nos deixa tão envergonhados, porque não há outro termo para usar – o Brasil é uma sociedade que vem com uma tradição escravocrata, dominadora. Uma classe média que é muito conservadora e elitista, num certo sentido. E eu estou falando como alguém que vem de classes privilegiadas, que foi educada nos melhores colégios. Mas eu tive um grande privilégio, eu fui criada por pais, sobretudo, meu pai, que tinha um senso, assim, de justiça e nos criou sempre com esse dever de olhar o outro, entendeu? Então quando eu digo a você que eu vou lá visitar o meu amigo, o querido Padre Júlio Lancelotti, vou com ele na Cracolândia distribuir quentinha, para mim, isso é algo que eu tenho que fazer. Porque eu acho que é uma vivência pedagógica num certo sentido, para que entendamos o que é esse país em que vivemos. Eu não estou vivendo na Escandinávia, onde eu não vou ter morador de rua.
“Eu estou morando em grandes cidades… São Paulo é uma coisa inacreditável. O que estamos vendo agora, o Rio de Janeiro também tem uma cidade morando na rua. Então, assim, não é possível que coloquemos um véu assim, como se fosse uma máscara, que não veja, e ache que isso é normal, entendeu? Não é normal.”
Eu estou morando em grandes cidades… São Paulo é uma coisa inacreditável. O que estamos vendo agora, o Rio de Janeiro também tem uma cidade morando na rua. Então, assim, não é possível que coloquemos um véu assim, como se fosse uma máscara, que não veja, e ache que isso é normal, entendeu? Não é normal. Então eu nunca entendi quando ouvi, muitas vezes, até de amigos e clientes, críticas sobre iniciativas do tipo doar coisas, ou mesmo as governamentais como Bolsa Família… Eu ouvi muitas vezes essa frase que me deixava chocada: “Não pode dar o peixe, tem que dar o anzol, ensinar a pessoa a pescar.” Eu disse: “quando você está sem remédio, com dor ou com fome, não tem nada que ensinar. Você tem que prover”. Então, desprender e prover tem que ser algo muito natural, inserido culturalmente, como se observa em outras culturas.
Há sem dúvida, outras culturas que são mais, eu diria, mais espontâneas e genuinamente generosas, como a própria cultura muçulmana. Eu viajei muito pelo mundo muçulmano, e é muito frequente aquela coisa de ficar dando… Eles vão dando assim, andando na rua, e vão dando um dinheirinho aqui, outro ali. É uma coisa do hábito, e é da cultura deles, independentemente de religião. Eu estou falando de cultura, e não de religião. São coisas distintas. Então, eu acho que nós, eu espero que nós consigamos alguma coisa, pelo menos ensinar as crianças e os adolescentes, criá-los e educá-los de uma maneira menos cega, sabe, míope no sentido de não enxergar aquilo que faz parte da nossa realidade.
“Eu disse: “quando você está sem remédio, com dor ou com fome, não tem nada que ensinar. Você tem que prover”. Então, desprender e prover tem que ser algo muito natural, inserido culturalmente, como se observa em outras culturas.”
Principalmente nesse tempo agora…
Eu confesso a você que, se nos perguntarmos, o mundo… e não só o Brasil.. Se você olhar o que está acontecendo na África, é um escândalo, gente. Como é que nós podemos ter obtido 80% da nossa população, a despeito de todas as dificuldades que conseguimos atravessar e alcançar essa taxa de população vacinada, e os países africanos terem 10% ou pouco mais do que isso, entende? Não há justificativa nenhuma para isso, a não ser a exclusão, a desigualdade vacinal. Os mecanismos previstos pela própria OMS, falharam. Não tem porquê. Não tem como justificar. Não há nada que logisticamente possa justificar isso, a não ser uma miopia patológica do mundo, das sociedades contemporâneas. Vivendo tudo que estamos vivendo, num sentido que para mim é assustador. Por exemplo, rede social… e a solidão dessa geração nova, que não tem contato mais com ninguém, a não ser com as redes. Eu acho tudo isso muito pernicioso. Não quer dizer que eu seja contra as redes sociais. Mas estas, sem uma educação para usá-las, o resultado que eu tenho visto é catastrófico. Tanto no sentido da ignorância, no sentido de ignorar a realidade, de se alienar da realidade quanto no sentido de não interagir com pessoas e, portanto, de olhar o outro, criar e fortalecer relações.
Ter esse olhar para o outro que eu considero fundamental. Quanto mais o tempo passa, eu me sinto mais sensível, e não menos.. E eu tento passar isso, quando eu falo para grupos de jovens assim… Eu, na semana passada fiz uma experiência espetacular. Fui chamada para falar para comunidade de jovens dos colégios franceses no Brasil, porque eu falo francês. E aí eu fiz uma palestra assim que só tinha jovens, adolescentes, muitas meninas, muitas moças que queriam entender como é que alguém pode ser mulher, cientista, médica, bem sucedida.… E me perguntaram “Como é que era sofrer assédio?”. Eu recebi perguntas interessantíssimas. Foi uma experiência linda, porque quando você está tratando com jovens, e você vê a experiência, a curiosidade delas, sobretudo, é muito interessante. E eu trago isso para mim, esse tipo de atividade… Alguém me pergunta assim: “Margareth, como é que você consegue arrumar tempo para ainda fazer isso?” Eu disse: “olha, eu acho que é tão importante, alguém tem que fazer”. E eu recebo perguntas tão interessantes, que também me fazem pensar. Algumas não, mas outras são muito interessantes. Então eu faço. Eu acho que é uma missão assim, e aí eu acabo fazendo. Me dá um trabalho danado, mas eu faço.
Você lembra de alguma dessas perguntas que te fizeram?
Uma me perguntou – foi até ingênuo e malicioso ao mesmo tempo, achei ótimo – Como que eu me sentia… como é que era? Porque devia ter ido na internet e visto umas fotos assim: “poxa, mas deve ter sido bem difícil, você deve ter tido muito assédio, porque você era uma jovem bonita e tal”. Fiquei até lisonjeada. Eu respondi: “olha, eu não posso me queixar muito da vida assim, os meus assédios foram muito sutis, nunca fui vítima de nenhum assédio ostensivo, mas eu sempre fui muito durona também. Não era fácil. Era muito esperta também. Não era bobinha, não, entendeu?” Então, eu tinha só uma cara de inocente, mas não era, era bem esperta. Então, eu tive assédio moral, sem dúvida, mas foram muito sutis mesmo. Uma coisa de gênero, basicamente. Eu fui diretora médica, por exemplo, do meu hospital na época era do Ministério da Saúde, não era Fiocruz. Eu era muito jovem, eu tinha chegado de um estágio na Universidade de Edimburgo no Reino Unido, e virei diretora médica de um hospital aos 33 anos. Eu tinha 33 com cara de 25. E aí, enfim, e era muito incrível, porque você imagina, todos os chefes de serviço eram homens e tudo. Mas eu tive um tempo de gestão excepcional. Foi um período muito, muito produtivo do hospital. Foi uma experiência duríssima, mas muito boa também, que me fortaleceu muito como pessoa e profissional.
Eu acho que assim é possível… Eu gosto de tudo que faço, não faço nada que eu não queira. Trabalho muito. Confesso que às vezes fico… não sou mais criança, tenho 68 anos de idade… mas eu gosto muito de conviver com os jovens. Talvez pelo fato até de eu não ser mãe. Mas eu tenho sobrinhos, eu sempre vivi com jovens perto de mim.
Você saiu no “20 Mulheres de Sucesso” da Forbes, certo? Como é ser latino-americana, brasileira, nesse lugar de pesquisadora frente à pesquisa internacional?
O mundo é muito preconceituoso. Por sermos brasileiras, temos que nos impor. Até porque, como eu venho de uma trajetória muito particular, e talvez por isso, quer dizer, eu falo inglês, francês, espanhol, desde muito jovem… Porque eu não venho das exatas para virar médica. Eu venho das ciências humanas. A minha família é uma família sem nenhuma tradição médica, é uma família de juristas. Então, eu desde pequena dizia que ia ser diplomata e meus pais me deram todo o apoio. Lia vorazmente, aliás o que faço até hoje, fui aprender línguas desde muito pequena. Quando eu entrei na faculdade de medicina, era perfeitamente capaz, então isso, ao longo da vida, me ajudou muito. Isso me ajudou, inclusive, a ter uma trajetória internacional.
Eu faço muita coisa. Eu sou membro de um grupo da OMS já há vários anos, eu sou membro de um grupo muito seleto da Organização Mundial da Saúde que define os medicamentos essenciais. E é um grupo extremamente rígido, do qual para se fazer parte, não recebe nada para isso, aceita-se pelo prestígio mesmo, porque é um grupo muito pequeno de pessoas e que define o que é um medicamento essencial para ser recomendado pela OMS e adquirido pelos países. E muitos países só compram medicamentos que estão no rol dos essenciais chancelados pela OMS. É uma experiência muito iteressante e tenho um mandato renovado que vai agora até 2026 . Mas eu já fiz parte de vários grupos de experts na OMS, na Organização Pan-Americana. Então não há dúvida que você tem que se impor, num certo sentido. Eu me lembro uma vez que eu cheguei num país latino-americano e eu desembarquei no aeroporto e tal… tinham ido me buscar e olharam assim, e eu era muito jovem… eu também falo espanhol, muito fluente. Eu fui para dar um curso, e aí alguém me perguntou assim: “e donde está a doutora Dalcolmo?” E eu disse: “Ah, doutora Dalcolmo sou eu”. Eles ficaram com uma cara tão frustrada. Quando pensaram assim: “o que é que essa jovem está fazendo aqui?”. Aí depois de uma semana ficaram meus amigos, com todo o respeito, entendeu? Aquela jovem estava ali, mas sabia o que estava fazendo. Não estava ali passeando. Então, essas coisas eu vivi, mas eu sempre tive muito senso de humor.
Eu nunca precisei ficar assim ofendida. Nunca tive nada assim grave, em termos de assédio. Foram coisas muito sutis, e mesmo internacionalmente, é a mesma coisa. Ser brasileiro… existe preconceito sim, existe preconceito, enfim, por ser mulher, dependendo do local onde nós estejamos. Enfim, mas nos organismos internacionais, menos, porque aí já é uma coisa mais de natureza técnica, não é? Mas existe. Eu acho que ser brasileiro exige uma expertise de quase que de comportamento, assim, muito especial, muito exigente, para se impor.
Como tem sido a sua atuação na pesquisa científica?
Quando soube que a nossa pesquisa da vacina BCG testada para COVID iria sair no New England, uma revista médica de tanto prestígio, fiquei feliz. Eu tenho umas 130 publicações mais ou menos, nacionais e internacionais. Eu gosto da pesquisa clínica. Eu faço trabalho com pessoas, e não pesquisa de bancada. E eu tenho uma linha de pesquisa a qual eu me dedico já há bastante tempo, que é na área da tuberculose, outras micobacterioses, da AIDS, do HIV. Então, ao longo dos últimos 30 anos, eu fiz bastante coisa em relação a isso e até hoje estou fazendo. Acabei agora um estudo em tuberculose, porque eu trabalho num centro de referência para doenças respiratórias transmissíveis, da Fiocruz, acreditado para tal.
Terminamos um estudo importante agora, um multicêntrico internacional para ver se conseguimos reduzir o tempo de tratamento da tuberculose, que é muito longo. E o Brasil fez parte de um estudo bastante importante. Nós esperamos que tenhamos sido protagonistas de uma mudança de paradigma mesmo no tratamento da tuberculose, que é uma doença muito prevalente no mundo. São quase 10 milhões de casos todo ano, no Brasil, são 80 mil casos a cada ano, com quase 5 mil mortes. A COVID-19 teve um impacto enorme sobre as doenças endêmicas, em particular sobre a tuberculose, porque os serviços fecharam, as pessoas abandonaram tratamentos, deixaram de fazer diagnóstico. Certamente o impacto foi importante. Essa é uma linha de pesquisa à qual eu me dedico já há bastante tempo, e durante a COVID, nosso serviço funcionou normalmente.
Ser pesquisador no Brasil também exige uma dedicação muito grande, porque não se tem as mesmas condições de trabalho que um pesquisador nos Estados Unidos, por exemplo, ou no Canadá tem. Nós trabalhamos um número de horas muito maior para poder dar conta de demanda, nós precisamos formar equipes que nem sempre são disponíveis nos nossos locais de trabalho, nós precisamos lutar para que os nossos sites, nossos serviços sejam credenciados para desenvolver estudos. Agora nós até melhoramos um pouco. Antigamente o Brasil era super mal visto porque tínhamos um sistema de aprovação de estudos no sistema Conep, CEP/Conep, muito lento, e agora não. Ganhamos mais agilidade, pudemos ser testemunhas de um processo de mudança viva. Hoje, um projeto internacional é aprovado ou não na Conep em 2 a 3 meses, no máximo, que é um período bastante razoável. Nesse momento estamos fazendo submissão do nosso serviço para um grande estudo da União Europeia, por exemplo. Porque é isso, você vai concorrendo. Os estudos são competitivos, então, ganha quem tiver melhores condições, resultados alcançados nos estudos anteriores. É difícil montar um serviço que seja qualificado para desenvolver pesquisa, dá muito trabalho, mas é um belo desafio.
E temos essa luta mesmo, na pesquisa aqui no Brasil… O que você diria assim para os nossos jovens pesquisadores? O que dizer hoje em dia para dar um norte para quem está começando ou para quem pensa em fazer pesquisa no Brasil?
Eu acho que para um estudante universitário a primeira coisa que eu diria é para entrar logo nesses programas de iniciação científica… logo no começo da faculdade, porque isso já vai dando uma certa familiaridade, até com uma linguagem que é muito própria de quem faz pesquisa. São termos próprios e uma disciplina à qual vai se habituando, inclusive a não transigir em muitas coisas. Quando você faz pesquisa, não tem jeitinho, tudo tem consentimento, você não pode fazer nada que não obedeça. Para isso, nós somos signatários de todas as declarações de ética em pesquisa com seres humanos. Então, assim, o Brasil tem um sistema de avaliação bastante rígido no bom sentido, bastante correto em relação a isso. Então, sempre que eu falo para o pessoal mais jovem ou para aluno, ou vou para uma banca de tese, eu sempre digo: “olha, dá um trabalho danado”. Às vezes, podemos até dar um soco na mesa, falar um impropério, entendeu? Mas sempre vale a pena. É muito bom.
Fazer a pesquisa da vacina BCG para COVID, gente, foi meio enlouquecedor no meio da pandemia… voluntário, efeito adverso… e lidar com tudo isso. Outros pesquisadores passaram o mesmo em outros estudos. E nós fomos o local que mais incluiu voluntários nessa pesquisa, com cerca de 1.650 pessoas. Ocorre que quando se recebe a notícia de que vai sair publicado num periódico como New England Journal Medicine, esquecemos todas as dificuldades pelas quais passamos, entendeu? Eu acho que medidas as devidas proporções, é como parir um filho, sabe? Você esquece as dores do parto. Depois que você vê aquele rebento ali, lindo, saudável. E você vê o paper publicado, ou você vê um aluno defendendo tese, um aluno chegando ao doutoramento e feliz da vida por estar ali, isso não tem preço. Então, vale a pena, sim, e exige disciplina. Tem que gostar, sempre. Se não gosta, não tem problema nenhum, vai fazer outra coisa. Não pode ter mais tanto médico formado e foi ser médico por razões que não era uma escolha dele. Às vezes é uma escolha da própria família. E não dá pra ser médico assim, sabe? Ser médico tem que gostar muito. Aliás, no posfácio do meu livro escrito pelo professor José Camargo, grande cirurgião e meu confrade na Academia Nacional de Medicina, ele diz isso com muita propriedade. Ele me conhece há muito tempo, e diz: “interessante é que a Margareth é médica o tempo inteiro, tem sempre um olhar pro outro, que mostra que é uma coisa diferente. Não é uma curiosidade, só. É um genuíno interesse”. E ele até termina de uma maneira muito engraçada, ele diz assim: “se a diplomacia brasileira perdeu uma grande embaixadora, a medicina brasileira só tem a agradecer pela médica que ganhou”. Ele é muito querido, professor Camargo, muito querido.
Como foi quando você se tornou essa porta-voz durante a pandemia? No seu livro você fala que de repente você fez uma live e ela teve mais de milhões de visualizações.
Sim, quase 3 milhões, segundo me disseram. E eu não tinha ideia, quando eu gravei aquela live, eu tinha chegado de Brasília, porque eu e outros colegas estávamos assessorando o ministro Mandetta, revisando os algoritmos de síndrome respiratória, e eu fui para São Paulo porque haveria um evento da Sociedade Brasileira de Pneumologia, da qual hoje estou na Presidência. E aí eu cheguei lá e o meu colega que tinha esse blog me falou: “ ninguém sabe nada dessa doença? Você não pode fazer um resumo para nós?” E assim gravamos, com o telefone celular, numa coisa mais despretensiosa. Aí, assim, foi uma coisa que durou menos de meia hora, 28 minutos acho. Quando eu estava indo dormir no flat, lá em São Paulo, ele me manda uma mensagem, meia-noite: “Margareth, você não tá entendendo”. Eu não entendia nada de rede, tá, gente? Vou logo avisando… nada. E aí ele falou: “nós estamos com 280 mil visualizações”. Havia se passado 7 horas. “ué, mas isso é muito pouco?” Aí ele caiu na gargalhada. Ele disse: “você não está entendendo, você estourou a boca do balão”. Aí no dia seguinte eu estava tomando café da manhã, ele me liga às 7:30 da manhã: “Margareth, estamos com 800 mil visualizações”. Eu falei: “nossa, Mauro, como assim?” Inocente, sabe? Aí, quando eu estava no aeroporto, em Congonhas, pegando o avião para voltar para o Rio, a Rede Globo me ligou: “A senhora é a médica que gravou uma live que já está com mais de 1 milhão de visualizações?” Eu falei: “bom, se está com isso, eu não sei, mas fui eu que gravei”. “A senhora pode vir ao vivo hoje?” Aí foi a primeira vez que eu fui convidada pela Camila Bonfim, que foi a jornalista da GloboNews, e eu fiz uma entrevista enorme com ela, de 40 minutos ao vivo, naquele dia 15 de março de 2020. E assim fiquei, muito presente nos meios de comunicação.
No dia 16, começaram aqueles programas enormes que eles tinham, que duravam 6 horas. Nas primeiras semanas, eu passava 6 horas dentro do programa, ia chamando outros colegas. Eu ia sugerindo, chamava um, chamava outro, né? A gente, de certa maneira, fez uma limpeza daquelas pessoas que ocupavam espaço, mas diziam muita bobagem, e eles foram nos ouvindo, com muito respeito. Vale a pena registrar que a imprensa brasileira, desde o início da pandemia, salvo raríssimas exceções, optou pelo caminho certo. Várias vezes eu disse: “não, essa opinião aí não, não ouça, porque não é boa”. Elas tomaram o lado da ciência. Realmente nos ouviam com muita atenção e isso é muito gratificante também. A imprensa brasileira realmente fez um trabalho extraordinário porque foi o consórcio de veículos de comunicação que produzia dados que o Ministério não produzia. E eram os dados com os quais todos trabalhavam. Eles aproveitavam, tinham contacto com a Fiocruz o tempo inteiro, porque a Fiocruz teve o Observatório COVID, que trabalhou permanentemente, como vocês sabem. Então nós trabalhamos muito na Fiocruz. Tanto para fazer vacina, quanto para gerar dados de confiança. Bom, não é à toa que a nossa presidente virou ministra.
E te tornaram divulgadora de ciência, né?
Eu já tinha muitas entrevistas feitas antes, em órgãos de imprensa. Essa coisa de saber falar para o público é uma espécie… como é que eu vou dizer? Não sei se eu posso chamar um dom assim, mas é uma capacidade. Porque, às vezes, médicos são prolixos. Então, durante a pandemia, era muito curioso, porque às vezes me ligava uma jornalista, como a Delis Ortiz, lá de Brasília, que é muito craque, jornalista experiente. E a Delis dizia assim: “doutora, é pro JN”, Ela brincava e dizia assim: “doutora, é pro JN, tem que ser a senhora”. E aí eu falava: “tá bom, quanto tempo eu tenho para falar, Delis?”. Ela dizia: “50 segundos, nunca chega a um minuto, 40 segundos, tem que dar recado”. E eu dava um recado. É a tal história, nós estamos aqui conversando há quase 1 hora, se você me disser: “olha, você tem que dar um recado em 40 segundos”, tem que saber dar. O tempo de televisão é muito particular e preciso. O que naquele momento é prioritário… como agora gravamos, vários especialistas, pela questão da vacina. “Tem que vacinar e tal, não dê ouvidos a bobagem, ninguém vai virar jacaré. Quantas vezes eu tive que falar que ninguém ia virar jacaré… ou ter aids ou mudar o DNA… foi chato até. Foi muito cansativo, mas a população brasileira ficou muito impregnada por isso. Infelizmente, estamos ainda vacinando numa velocidade menor do que a desejável. Porque, ao contrário de sempre… tivemos uma tradição de muita confiança nas vacinas no Brasil, e isso foi contaminado, não majoritariamente, mas suficiente para dar impacto negativo na vacinação.
Como você vê a divulgação de ciência no Brasil hoje? Muitos se mobilizaram durante a pandemia. Como você vê esse resultado?
Olha, francamente falando, reunimos um time de pessoas muito qualificadas, que hoje podem falar pela ciência, sabe? Tem colegas, o próprio doutor Esper Kallás, que hoje está dirigindo o Butantan. As pessoas da Fiocruz, meus colegas, doutor Renato Kfouri, pediatra em São Paulo, que é da da Sociedade Brasileira de Imunizações, Alexandre Naime, Clóvis Arns, quer dizer, gente de muita qualificação, a Natália Pasternak que é bióloga e que também trabalha no Instituto de Ciência, o ex-ministro José Temporão, o grande virologista Amilcar Tanuri… pessoas que se tornaram porta-vozes e que, de certa maneira, mesmo não necessariamente pensando igual em tudo, mas sabendo dar um recado, passar a mensagem. E eu acho que isso, em última análise, conseguiu, afastar dos órgãos de comunicação gente que trabalhou de maneira muito nociva, inclusive médicos…. Falando mal das vacinas, dando informações, inventando coisas, usando politicamente. Vários viraram candidatos a cargos eletivos. Acho que é inadequado, no mínimo, para usar o adjetivo mais light que eu me lembro agora. Então hoje o que ocorre, tristemente, é que essas pessoas se valem de redes sociais para disseminarem aquilo que elas pensam. Muitas ganharam dinheiro, inclusive. E é muito triste que isso tenha acontecido, mas toda tragédia, além de gerar alguma coisa boa a posteriori, ela gera durante também alguns monstros. Ela gera coisas ruins mesmo. Isso sempre aconteceu. Negacionismo não é uma coisa de agora. É um fato histórico.
Então, é mais ou menos isso… eu me sinto igualmente bígama nesse sentido, porque vivo entre dois amores. Eu sempre li muito e eu sempre escrevi, então… escrever dói, certo? Como diz o Saramago… mas é muito bom – uma dor boa.
“Um tempo para não esquecer” é um nome maravilhoso nessa questão da memória, na questão do trauma, do que é importante para a gente estar ali lembrando. Você trabalha muito com essas citações nessas referências, como o “Decameron”, “A Montanha Mágica”, “Ensaio sobre a Cegueira”… é um modo de registrar, né? Ficar para a história ali. O seu livro, ele é muito interessante nesse sentido porque é a coletânea das suas colunas. Então, parece que a gente vai vendo ali quase que um diário, um relato de tudo o que foi acontecendo durante a pandemia, sempre com toda a poética, toda essa parte sua da literatura que vem junto. E não é à toa que ganhou o Jabuti. Então, como foi o processo de escrita durante todos esses anos? Como que foi se debruçar ali para fazer cada coluna? E depois, como foi rever tudo isso e organizar para fazer o livro?
Ler e escrever sempre foi um hábito muito incorporado à minha vida. Eu costumo dizer que, como Tchekov – Tchekov tinha essa mesma bigamia, ele dizia: “a medicina é minha mulher e a literatura, minha amante”. Então, é mais ou menos isso… eu me sinto igualmente bígama nesse sentido, porque vivo entre dois amores. Eu sempre li muito e eu sempre escrevi, então… escrever dói, certo? Como diz o Saramago… mas é muito bom – uma dor boa. E então eu sempre escrevi, e quando a pandemia começou, já no final de março de 2020, O Globo me perguntou se eu podia escrever semanalmente no jornal e, durante 2 anos e meio, mais ou menos, eu escrevi semanalmente em O Globo e, agora, escrevo quinzenalmente. Eu estava muito sobrecarregada de trabalho, pedi para ser quinzenal.
E o livro surgiu, na verdade, porque tudo o que eu escrevi tem um fio cronológico desde o surgimento da pandemia, então a editora me sugeriu.
E o livro surgiu, na verdade, porque tudo o que eu escrevi tem um fio cronológico desde o surgimento da pandemia, então a editora me sugeriu. Eu tinha conversado com a editora Bazar do Tempo, então eu usei os arquivos originais, porque o jornal tinha alguns artigos, que ficaram menores, publicados para obedecer ao tamanho da coluna… agora até os meus artigos estão maiores. Assim, editei os arquivos originais e fiz o livro iniciado por um capítulo original, onde eu narro como tudo começou e tem um prefácio do Domício Proença, que é acadêmico da ABL e é muito meu amigo. E tem um posfácio do professor Camargo, que é um também um escritor, médico, é meu super amigo e tem as orelhas da Nélida Piñon, que também era minha amicíssima, enfim, tinhamos uma bela amizade, ela e eu. Enfim, o livro é isso e eu já estou pensando em escrever o próximo livro. Já estou com ele, mais ou menos arquitetando… se eu vou escrever… porque o meu livro ele termina, ele é pré-ômicron e termina em dezembro de 2021, eu não pretendo, e nem a editora, fazer uma edição ampliada… Não é isso… Eu acho que eu vou escrever um outro livro agora – uma outra coisa. Mas eu pretendo continuar escrevendo naturalmente. Escrever é bom demais. Pensar, racionalizar, e desprender o imaginário.
Você é bibliófila, coleciona vários livros… Nos conte um pouco mais sobre essa coleção de livros, como você começou…
O que eu tenho é uma biblioteca dinâmica, onde eu guardo algumas coisas que me são muito caras, que eu já li – caras afetivamente – e que eu não me desfaço, e outros que eu leio e me desfaço… porque se eu fosse guardar todos os livros que eu já comprei ou que eu recebo realmente, aí não teria mais lugar. E como na minha casa havia duas bibliotecas, porque meu marido era um grande intelectual que faleceu há 2 anos, a biblioteca dele foi para a universidade. Eu doei para a universidade e fiquei apenas com os livros que eram dedicados a mim e a ele juntos. Então agora só tem uma biblioteca em casa. Como não tínhamos filhos, temos bibliotecas… na minha casa, tem livro em tudo quanto é lugar, até no lavabo… então, assim… quando alguma visita demora muito a sair, é porque eu sei que achou alguma coisa boa lá para ler.
Eu aprendi a ler muito pequena assim. E eu tenho uma disciplina de leitura em que eu leio e anoto. E é um prazer buscar os meus livros, na minha biblioteca que virou uma das estantes mais conhecidas do Brasil, por conta das lives. De vez em quando alguém nota, e é muito engraçado isso, gente, vou contar isso porque é engraçado. De vez em quando, alguém fala assim: “e mudou… a senhora mudou a estante, né?”, quando movo algum objeto de lugar. Elas prestam atenção.
E eu tenho meu Zé Gotinha na minha estante… o Zé Gotinha que eu ganhei, que é lindo, feito de tricô, assim, maravilhoso, que uma paciente fez pra mim. Eu até mandei fazer um agora que eu vou dar pra a ministra, para Nísia Trindade, para ela botar no gabinete dela, que é lindinho assim, mas enfim, é isso, gente.
E sua relação com a Academia Brasileira de Letras?
Eu tenho grandes amigos na Academia porque eu convivi muito, pois meu marido era acadêmico da ABL, então temos grandes amigos queridos. Alguns são meus pacientes e eu cuido deles. Eu tenho amigos muito queridos na Academia de Letras, amigos de muito tempo, como o próprio presidente Merval Pereira, Marco Lucchesi, que é um amigo assim fraterno, Paulo Niemeyer meu amigo e confrade na Academia de Medicina . Enfim, Rosiska Darcy, que é outra amiga fraterna para mim, Zuenir Ventura, que me conhece desde que eu era adolescente, Antonio Carlos Secchin, Ana Maria Machado, que é minha comadre, inclusive, José Paulo Cavalcanti e outros queridos. . A Academia me é um ambiente muito caro também. Eu sou acadêmica da outra Academia, da Nacional de Medicina.
Alguns já se foram infelizmente, que deixaram muita saudade, como a própria Nélida, para mim é uma saudade, assim, enorme. Não ter mais a Nélida para escrever aqueles bilhetinhos lindos… nós nos fazíamos mimos, sempre. Como nós morávamos perto durante a pandemia, eu levava coisinhas que ela gostava. Ela era uma Catalana, uma galega, daí eu levava presunto, deixava na portaria dela e ela mandava entregar bolinhos para mim. Estes pequenos mimos, durante os duros 2 anos iniciais da pandemia, tão duros, tentavam adoçar um pouco essa distância. Muita gente fez isso. Alguns clientes faziam isso. Mandavam até quando eu fiquei doente com a COVID-19.
Como foi este período em que esteve com o COVID-19?
Foi muito impressionante. Assim, nunca pensei que nos dias em que eu fiquei em casa, antes de ir para o hospital, eu receberia tantas coisas, tantos mimos. As pessoas mandavam entregar naqueles deliverie. Assim, impressionante. Uma experiência muito particular para mim, que eu tive com a doença, sabe? De me sentir muito querida, pois a imprensa ligava e mandava mensagens porque eu já estava muito envolvida.
Eu fiquei doente no fim de abril de 2020 e, assim como amigos e clientes, eu não sentia gosto nem cheiro de nada, mas eu recebia tanta coisa gostosa para comer. Eu comia tudo! (risos) Desculpa as brincadeiras, mas é porque foi uma experiência! Não tenho nenhum problema de falar sobre isso: muita gente me pergunta se eu tive medo, e eu tive muito medo. Eu vivi algumas noites em que eu não dormia, eu ficava com oxímetro esperando a falta de ar chegar e eu tive muito medo sim. Eu fiz um caderninho… não foi um testamento formal, mas foi um testamento sim. Eu deixei todos os meus – não sei se todos – mas grande parte dos meus desejos anotados, o que eu queria que fosse feito com as minhas coisas. A começar pelos meus livros. Pedi que não fossem separados, porque os meus livros são organizados entre biografias, autores brasileiros, autores franceses… eu tenho tudo muito bem organizado.
E então ter vivido com o medo, e é uma maneira também de entender o medo que eu já vivia vendo nos pacientes. E naquela solidão, naquele isolamento dos espaços COVID… naquilo que eu chamei – eu escrevi um capítulo de livro que vai sair agora, que é um livro sobre o luto, e eu escrevi um capítulo sobre o luto na COVID-19, em que eu defino e dou o nome – como um luto pressentido. Porque as pessoas, elas sentem que elas vão entrar naquele espaço de isolamento, onde elas só viam aquela fenda dos nossos olhos – uma experiência muito, muito particular assim, então eu pretendo escrever um pouco mais sobre isso.
E como forma de não esquecer este trauma tão grande que a gente viveu…
É, eu parto as nossas vidas em AC/DC, não é? Antes de Cristo, depois de Cristo… antes da COVID, depois da COVID… porque temos um acúmulo de cicatrizes, de perdas. Quem aqui entre nós não perdeu gente querida, um amigo, um parente, um colega de trabalho, né? Eu perdi 3 colegas de turma. Então, foi muito, muito duro, gente que perdeu pai e mãe, órfãos… adolescentes que ficaram órfãos. Muito, muito triste.
Você se interessa muito pela história das pandemias, não é? Pode nos contar um pouco sobre este interesse literário?
Este meu interesse literário é muito relevante para o que eu penso, reflito, escrevo. Se você for estudar e ler sobre isso, vamos entender que há uma lógica. A história das epidemias é um pouco a história do homem no planeta. Porque nós temos epidemias desde muito tempo, vêm de muito longe. Então, se for por exemplo, a história das pestes… algumas que nós nem sequer sabemos do que é que foram… a Peste Antonina, ainda no Império Romano, acha-se que foi varíola, mas ninguém tem muita certeza. Então são coisas… e cada um desses episódios que marcam certos tempos ao longo dos séculos, elas geram alguma coisa, de impacto cultural, depois.
Então, a COVID-19, ela foi disruptiva nesse sentido, em que certos modelos epidemiológicos foram registrados, e isso, apesar de ser muito triste, é muito instigante e inspirador para que reflitamos e nos preparemos para as próximas pandemias.
E ao dizer isso uma vez, um jornalista muito esperto, não sei… acho que foi o Mário Sérgio Conti que me entrevistou, acho que foi ele. Me perguntou assim: “mas o que é que você acha? Qual é a sua esperança?” Quando eu falei: “olha, as grandes pestes do final do século XIV, da segunda metade do XIV, elas geraram o Renascimento, não é o que é que veio depois? O Renascimento? A Gripe Espanhola. Que nem foi logo em seguida, e sim ao final da Primeira Guerra Mundial. Mas ela gerou muitas coisas. No Brasil desde a feira de 22, na Semana de Arte Moderna, enfim, houve movimentos, e o Brasil foi duramente atingido pela Gripe Espanhola”. Nós tivemos muitos casos, muitas mortes… tem relatos literários da Gripe Espanhola, como o Pedro Nava, por exemplo, que descreve com muita propriedade o que era o Rio de Janeiro, que enterrava 100 pessoas por dia, passou a enterrar 900. Emulando um pouco isso, vivemos no norte do Brasil, com a tragédia de Manaus, que enterrava 30, 32 pessoas por dia, passou a enterrar 180, como nós sabemos, ou como Nova Iorque, a cidade mais rica do mundo, fazendo cova no Central Park para enterrar pessoas em cova rasa com a COVID-19. Então, a COVID-19, ela foi disruptiva nesse sentido, em que certos modelos epidemiológicos foram registrados, e isso, apesar de ser muito triste, é muito instigante e inspirador para que reflitamos e nos preparemos para as próximas pandemias.
OBRA DA AUTORA
UM TEMPO PARA NÃO ESQUECER – A VISÃO DA CIÊNCIA NO ENFRENTAMENTO DA PANDEMIA DO CORONAVÍRUS E O FUTURO DA SAÚDE
Margareth Dalcolmo
Desde o início das contaminações pelo novo coronavírus, a pneumologista Margareth Dalcolmo acompanhou de perto, como médica e pesquisadora especializada, as repercussões clínicas, os efeitos sociais e os esforços da comunidade científica para encontrar vacinas capazes de conter a vertiginosa propagação da Covid-19. Tornou-se referência nacional ao comentar na grande imprensa, com segurança, lucidez e empatia, os desafios e desdobramentos da pandemia que mudou o curso do planeta. Assim, os artigos reunidos neste livro, escritos semanalmente para o jornal O Globo, constituem uma espécie de diário que documenta no calor e estupor dos acontecimentos a visão da ciência em sua essencial missão humanista. Faz com isso história – de um tempo para não esquecer.